Hello Tédio, my old friend

Hello Tédio, my old friend

2 de julho de 2020 1 Por Agatha Pedersen

Todo mundo, absolutamente todo mundo já sentiu tédio em algum ou vários momentos. Para os privilegiados da quarentena, tédio é um adorno disputado nas mídias sociais. Uma batalha infindável de quem está mais entediado contra quem consegue se “reinventar” mais. Até se aventurar em fazer faxina ou cozinhar alguns conseguiram, pasmem. Enquanto isso aos desprivilegiados só resta dar de cara com perigo ao ter que se expor e viver “normalmente”. Tédio? Fica para uma próxima… Apesar de se encaixar perfeitamente em uma crítica sobre a luta de classes, esse não é um texto sobre isso. É um texto sobre o tédio em sua mais pura forma, despregado de uma situação de calamidade pública que escancara desigualdades…

Pois bem, tédio. Do latim, tædĭum, significa um desgosto profundo que provoca desinteresse por tudo que nos cerca. Pesado esse “profundo”. Dá um certo grau de vergonha ou talvez até ingratidão dizer que se está entediado. Mas como nem tudo são flores, temos que aceitar nossos diferentes lados, nas alegrias e tristezas, como toda boa união matrimonial. E que união!

Já parou para reparar que geralmente sentimos tédio quando estamos sozinhos? Ou melhor, quando não podemos interagir com algo/alguém. Sim, geralmente sentimos tédio quando temos que ficar sozinhos e sem uma atividade para fazer, sendo que em várias vezes que temos alguma atividade para fazer, queremos ter o tempo livre para nada fazer. Incoerências humanas? Temos de sobra.

Timothy Wilson, um psicólogo norte americano, em um estudo, convidou algumas pessoas (escolhidas aleatoriamente)  a ficarem em uma sala, sozinhas. A sala não tinha nenhum estímulo distrator, e o objetivo era que elas não fizessem absolutamente nada além de curtirem os próprios pensamentos por 15 minutos. Nessa sala havia somente um botão, o qual as pessoas já tinham tido acesso antes de o experimento de fato começar. Pressionar o botão em questão resultava em um choque, que foi descrito pelos participantes como “desagradável”. Interessantemente, 67% dos homens e 25% das mulheres interagiram com o botão de maneira voluntária dentro desses 15 minutos, ainda que o choque fosse desagradável e ainda que lhes foi explicado que o objetivo primário do experimento era curtir seus pensamentos, sem nada fazer. Não entrarei na discussão da diferença de resposta entre homens e mulheres, devido ao número pequeno de participantes, mas ainda sim, é interessante que muitas pessoas prefiriram tomar um choque do que ficar 15 minutos sem fazer nada em uma sala sem nenhum estímulo para se distrair (vale ressaltar que teve um outlier que pressionou o botão 190 vezes neste intervalo de tempo).

Você sente alguma  urgência em fazer algo quando é deixado brevemente sozinho, como quando alguém que está contigo em um restaurante vai ao banheiro, ou quando você chega em um encontro antes das pessoas? Você precisa pegar o celular, quebrar palitinhos de dente, ou fazer bolinha de guardanapo enquanto aguarda? Você acha estranho ver uma pessoa sozinha e que não está fazendo nada? Não achamos esquisito uma pessoa que se arruma e vai a um restaurante para comer sozinha? (Aqui não entra almoço do dia a dia em que você tem que comer rápido dentro da 1h que tem de almoço). Ou uma pessoa sentada sozinha em um banco de praça, olhando pro nada…Reparamos muito mais nessas pessoas do que nas que estão perdidas no telefone, por exemplo.

É engraçado como o não lidamos bem com o não fazer nada, mas faz total sentido. O nosso tempo vivido pode ser divido em dois pedaços. Passamos o dia vivendo no futuro, trabalhando e aprendendo e conquistando para poder receber algo em troca desse esforço no futuro (seja ele perto ou longe). E no chuveiro ou antes de dormir temos medo do futuro ou amarguramos algumas coisas do passado, porque, afinal, um ser humano do seculo XXI sem uma paranóia não é um ser humano do século XXI. A questão é: fazemos as coisas com um sentido, um objetivo. Até mesmo o descansar tem um objetivo: distrair com uma série, um livro, ou tomar uma cerveja com amigos para descontrair. Mas não lidamos bem com o NADA. O NADA é perda de tempo (alerta de crítica: sendo que perdemos muito mais tempo fazendo outras coisas desnecessárias). A gente diz que tem urgência de viver. Precisamos aprender, precisamos correr, precisamos melhorar isso e aquilo, conquistar aquilo outro. E assim a vida vai tendo sentido e propósito para se levantar 6h da manhã… um atropelamento atrás do outro.

Mais de mil blogs relatam os benefícios da meditação e ioga até entrou na moda das celebridades o que consequentemente conseguiu difundir a ideia de meditação, reconexão e respiração para mais pessoas. Incrível como não damos valor à uma das ações mais vitais: respirar. E nesse ritmo que vivemos, não respiramos…Ventilamos.

É diferente.

De todo modo, o “não fazer nada” não é na verdade não fazer nada. Pode ser prestar atenção na sua respiração, pode ser um sentar e observar o seu arredor, curtir um por do sol sem pensar no lá fora, em quantas curtidas uma foto ali vai render…Pode ser um olhar pro teto ao estar deitado na cama, mas sem vagar no futuro ou no passado. Somente existir por um momento (às vezes esquecemos que existimos).

Esse texto não é para pregar um estilo de vida em detrimento de outro, mas sim relembrar que para uma mente destreinada, o estar consigo mesmo é um incômodo que grita silenciosamente. E tome cuidado com os gritos do seu corpo que você não consegue escutar…