Relacionamento Abusivo

Relacionamento Abusivo

24 de setembro de 2019 1 Por Agatha Pedersen

Todo mundo já passou por um relacionamento abusivo. Esta não é uma frase derrotista no sentido de não se ter fé na humanidade ou que todo mundo tem no seu DNA informações imutáveis que nos garantem fazer papel de trouxas em algum momento da vida (essa hipótese fica para outro texto). É apenas uma triste casualidade: eventualmente a gente cai em um relacionamento abusivo, e isto é mais comum do que percebemos. E aqui vou compartilhar o relacionamento abusivo, que tem se feito presente há bastante tempo em minha vida: o relacionamento de mim comigo mesmo.
Este pensamento surgiu em mim este ano, quando completei 25 anos, e como brincadeira, fiz um convite de aniversário convidando a todos meus amigos para comemorar o bodas de prata da relação de mim comigo mesma. Um relação de altos e baixos, alegrias e tristezas, saúdes e doenças, mas que como toda boa união matrimonial, só se melhora com o tempo.
Foi aí que eu comecei a refletir: como tem andado a relação de mim comigo mesma?
De fato, todo mundo tem seus conflitos internos, seus momentos de puro orgulho em que você é o último biscoito do pacote, e os momentos de pura bad, nas chuveiradas silenciosas imaginando as mil maneiras que você poderia ter feito algo diferente.
Mas fora esses conflitos comuns que temos no dia a dia, temos também os conflitos mais enraizados, geralmente o que carregamos há tempos, e que também temos mais dificuldade de externar.
Podem ser coisas que trazemos da infância, que adquirimos na adolescência ou até mesmo que aconteceu na vida adulta, mas está lá, enrustida nos ossos, presente  em cada movimento que fazemos.
No meu caso, eu descobri que eu tenho um relacionamento abusivo comigo mesma, e isso vem sendo carregado comigo em todos os lugares que vou. Mas aí entra o conflito. Relacionamento abusivo é quando um exerce controle sobre o outro em benefício próprio. É quando um poda o outro, não em sentido de crescimento e força, mas em sentido de diminuir para se sentir maior. É se sentir dono.
Então como isso pode acontecer em mim comigo mesma?
Obviamente os conceitos precisam ser um pouco relativizados. Mas se eu sentar sem julgamentos e olhar sem julgamentos para minha alma, eu percebo: não me trato tão bem quanto trato outras pessoas, e este, é o pior dos meus pecados. E eu digo isso, porque só eu vou conviver comigo do início ao fim.
Então como posso ser abusiva comigo mesma?
A raiz do problema está em não ser verdadeira, e quem poda isso em mim, não é ninguém menos do que eu mesma. É me sentir menor por não estar dentro de um certo “ideal”; é me cobrar o triplo por acreditar que se falhar não estarei correspondendo a certas expectativas; é pensar 5x no que será que estão pensando de mim, ao invés de simplesmente ser o que se é; é acreditar que com outras pessoas sou mais, do que apenas eu comigo mesma.
Esse relacionamento é tão perigoso, que quando se vê, você está em um trem desgovernado seguindo para um rumo que você acredita que é o que vai trazer maior satisfação, mas te leva cada vez mais longe da sua singularidade.

E seguimos em frente, com mais do mesmo e o mesmo do menos.

Quando você decide parar o trem, é bem difícil, afinal toda mudança é gradual, e haja freio para conseguir parar repentinamente uma carga pesada em alto movimento. A desconstrução dói. E muitas pessoas não vão entender, porque sempre te conheceram de uma forma, e não estamos habituadas a pessoas plurais, a múltiplos significados, a diferentes construções.
As vezes, nem a gente mesmo entende. Só sente que tem algo fora do lugar, ou nem isso, apenas sente a urgência de algo diferente.
Para cada um o processo é diferente. Comigo ainda está no passo de saber que eu tenho que descer do trem. Como? Eu ainda não sei.
Entendo que eu tenho que dar um basta no outro eu que quer satisfazer expectativas que eu acredito que o meu redor coloca sobre mim (e eu digo ‘acredito’ porque muitas vezes são coisas da nossa cabeça mesmo). Entendo que devo ser meu maior compromisso, não me atrasar, não me sabotar, não me julgar, não me deixar pra depois: ser cada pedacinho disso que me forma, do jeitinho que se é.
E esse primeiro passo já me deixa bastante feliz, afinal, essa epifania é um presente, que muitas pessoas nem chegam a desembrulhar.